As histórias são amáveis quiproquós em pequenas peças de teatro do absurdo em que o autor foi mestre. São histórias de bairro e aldeia, pequenos enganos e grandes distrações, pacatos costumes cortados por um nonsense amável, sem sinal de pecado ou culpa. Nas ilustrações aqui apresentadas, em livros com histórias suas, na Colecção Infantil da Editora Ática nos anos de 57 e 59, o ilustrador revela uma extraordinária rarefação gráfica em ilustrações bidimensionais, sem perspectiva, com cores planas intensas, brancos amplos contrastados por traços finos e pretos compactos. A figuração angulosa dos personagens, tão comum na época, é matizada pelas curvas suaves que se constituiriam marca de autor. Em Histórias de pessoas e bichos e O compadre Simplório tem os pés tortos, a ilustração revela-se em surpreendentes dípticos, preto e branco na página par, cores directas na ímpar.
José de Lemos (Lisboa, 1910-1995) foi humorista melancólico em traço virtuoso e inconfundível. Teve participação notável no Papagaio, revista infantil de Adolfo Simões Müller, iniciada em 1935, em substituição de Thomaz de Mello (TOM). E uma ligação de sempre ao vespertino Diário Popular, onde começa a colaborar com a sua Página Infantil desde o início do jornal, em 1942. Ligado à segunda geração modernista portuguesa, Lemos personaliza o traço paulatinamente ao longo dos anos 50, já visível nestes três livros, e atingirá o seu esplendor no Diário Popular ao longo das prolíficas décadas de 60, 70 e 80, em bandas desenhadas, tiras cómicas, cartoons (o célebre Riso Amarelo), rubricas infantis e um prodigioso conjunto de tricromias para centenas de episódios policiais e de espionagem, nos suplementos Volta ao Mundo e Sábado Popular.
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