
— «De um só verso vemos emergir o símbolo de um destino, o horror da agonia sobre-humana da guerra, o jogo de interesses daqueles que, sem serem Governo, governam o mundo… E a infindável e caótica multidão de vencidos, que todos somos, anel imponderável de uma cadeia solar, obrigada a cumprir a sua humanidade.» — Natércia Freire, 1972
As ilustrações de 10 Composições gráficas de Thomaz de Mello/Tom/sobre versos de «Os Lusíadas» de Luís de Camões tiveram origem no convite de Natércia Freire para uma única ilustração a propósito do quarto centenário de Os Lusíadas, numa futura exposição que a escritora comissariava: Os Lusíadas que Fomos, os Lusíadas que Somos. Glosando a canónica obra quinhentista, Tom afasta-se da preguiça plástica dos outros artistas convidados e multiplica por dez a encomenda, criando um álbum onde faz um ajuste de contas cruel e desiludido com um mundo orweliano em que o artista já não se revê. Não é difícil enquadrar esta obra na agonia do regime ou nos grafismos de João Abel Manta, que empreendia por essa época uma demanda solitária contra a decadência moral e política do país nas suas ilustrações, cartunes e caricaturas. Tom publicará a obra no ano seguinte, 1973, no formato de 35 x 32 cm e as páginas coladas em banda contínua. Os originais das composições, em grande formato, eram traçados a tinta da china e redes gráficas autocolantes de diferentes densidades. O luxuoso objeto gráfico é o canto do cisne do ilustrador Tom. Doravante, a sua carreira será orientada essencialmente para a gestão da Artécnica, galeria de arte e loja de mobiliário contemporâneo no Chiado e, já na década de 80, para uma chuva de coleções serigráficas em volta das suas amadas cidades de Lisboa, Porto e Bahia.









Tinta da china e redes gráficas sobre papel, 35 x 45 cm

O texto foi rescrito a partir do catálogo Tom, dedicado às exposições Os Bonecos de Tom e Tom – Todo o Design Possível, 2020

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Muito bom. Grato pela publicação.
Zé Oliveira
Eu amei!