Na campanha de 1978 para as eleições legislativas, as últimas a que se candidatou isolado, o PCP tinha já perdido, nas reviravoltas do PREC, o furor internacionalista a amarelo e vermelho em grafismos que, entretanto, se tinham tornado imagem de marca dos aguerridos concorrentes (e inimigos) do PCTP-MRPP. Era tempo então, para um suave e abrangente nacionalismo a verde e vermelho da bandeira portuguesa que caraterizou, por algum tempo, muita da comunicação visual do PCP. Por entre os milhares de ilustrações e grafismos anónimos que alimentavam a frenética criação do autocolante de propaganda, do apelo ao voto no partido até às reivindicações das organizações sindicais que lhe eram próximas, destacam-se facilmente algumas séries, de rara perfeição visual, com os seus altos contrastes de raiz fotográfica mas desenhados com plasticidade, e grafismo erudito baseado em fontes lineares como a Akzidenz e a Helvética. Se a ausência de assinatura quadrava bem com as exíguas dimensões do objeto e com a crença num coletivismo sem heróis, foi relativamente fácil chegar ao criador destes exemplares autocolantes.
Artista plástico com obra de pintura, gravura, serigrafia, cenografia, escultura e fotografia, haveria de consumir cinco décadas da sua vida na Fábrica de Sant’Ana, desde o ano de 1936, desenhando maquetas para projetos de azulejaria, concebendo moldes para escultura em barro, em alto ou baixo relevo, pintando painéis e garantindo também a direção dos artistas e artesãos da Sant’Ana. Sempre desvalorizou o seu trabalho de ceramista e pintor de azulejos, e queixava-se de que a rotina da fábrica destruía toda a capacidade inventiva e imaginação. Dizia que «pintar é um acto de felicidade» e montou ateliê na Avenida da Liberdade, onde se tornou um pintor de domingos. Apesar da sua vasta obra na Fábrica de Sant’Ana, o artista e militante comunista mostrava-se frequentemente frustrado, sobretudo pelas encomendas de gosto académico e revivalista adotado pelo SNI ou por arquitetos e decoradores que praticavam a arquitetura da Casa Portuguesa ou o oficial «Português Suave».
Graças à memória de alguns companheiros da militância política dos anos setenta, sabemos que Rogério Amaral (Lisboa 1917-Costa da Caparica 1996) foi o criador destes preciosos autocolantes.
Fontes
Elementos para a História da Fábrica de Faiança e Azulejos Sant’ Anna, desde 1741, Gonçalo Couceiro, 2015
O Almanaque agradece a colaboração de José Araújo, Leonardo De Sá, Manuel Quadros Costa e Teresa Dias Coelho.
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