A coleção Lusitânia, da Livraria Lello & Irmão, foi “a mais encantadora e selecta das coleções portuguesas” nas palavras dos seus editores. O seu formato de bolso (16 x 11 cm), capa dura de percalina e exuberantes aguarelas na sobrecapa, tornam-na num must para apreciadores de ilustração. Os seus mais de 70 volumes revelam os grandes clássicos franceses e a nata das letras portuguesas de todos os tempos com particular atenção ao século XIX: românticos e realistas como Garrett e Eça, muita da copiosa obra de Camilo Castelo Branco, com destaque para obras em que parodia a nova corrente do Realismo, ou o Naturalismo de O senhor Deputado de João Lourenço Pinto. Por estes livros desfila o Portugal real dos negócios sujos e amores sórdidos. Pelos enredos evoluem brasileiros deslumbrados, novos-ricos rapaces, herdeiros parasitas, abades gulosos, mulheres sufocadas no jugo dos maridos e políticos caceteiros, compradores de votos e consciências. Alberto Souza (Lisboa, 1880-1961) foi o artista certo para o retrato. Precioso aguarelista, herdeiro do naturalismo oitocentista, Souza estava muito à vontade no registo histórico e na historiografia de trajes e costumes tradicionais. O verismo gráfico já lhe tinha custado a reprovação dos primeiros modernistas, mas é extremamente eficaz nestas miniaturas, em reedições dos anos 30 e 40 do século passado. As carnagens escuras e rotundas, escorrendo humidade e presunção, metidas a custo em fatiotas burgesas ou em camisas e corpetes de duvidosa brancura, dão-nos retrato acertado e cruel da realidade portuguesa de meados de Oitocentos.
Filed under: Alberto Souza, Lusitânia, Alberto Sousa, Lello & Irmão, Lusitânia