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histórias da ilustração portuguesa

Folhas Caídas (VI)

Romano ou grego, é o deus do vinho, da bebedeira, e das orgias sexuais. Baco ou Dionisos aparece-nos sempre em eterna libação, empunhando copos, garrafas, canecas, jarras e cântaros, tudo o que possa conter o delicioso néctar que embriaga os sentidos. Nestas ilustrações a desnudada anatomia da divindade tem traço académico mas a cara bolachuda e o incrível toucado de raios bicolores remete para a gramática habitual da ilustradora. Ao glamour de sofisticados turistas em requintado consumo de copo e mesa, prefere Maria Keil (Silves, 1914-Lisboa, 2012) uma sensualidade pagã que tanto evoca os prazeres da uva como o omnipresente sol do Algarve. A encomenda do Estúdio ETP, agência pioneira da publicidade comercial com quem Keil colaborava regularmente, é uma Carta de Vinhos para o Hotel Algarve na Praia da Rocha, sinal do carinho que a indústria do Turismo reservava à ilustração editorial ainda por esses anos sessenta. A liberdade plástica e metafórica de Keil é uma raridade na propaganda da indústria vinícola geralmente ilustrada pela visão rural e heróica das vindimas. A sua importância para o Estado Novo pode ser aferida pelo slogan “Beber vinho é dar de comer a um milhão de portugueses”, atribuído a Salazar no ano de 1935. A Carta de Vinhos, em pesada cartolina creme encadernada a argolas e impressa a seis cores diretas, está ornamentada com onze divindades, reclinadas em posições variadas ao sabor da caprichosa geografia das regiões vinícolas demarcadas, em mapas simples também da autoria de Keil, que a garrafeira do hotel Algarve recomendava aos seus estimados clientes.

Fallen leaves VI

Roman or Greek, he’s the god of wine, drunkenness and orgies. A constant presence at libations, Bacchus or Dionysius is always shown holding a glass, cup, jug, bottle or anything that can contain that delicious intoxicating nectar. In these illustrations, the naked god has been academically drawn although the chubby face and the incredible two-coloured rays of his crown or halo reveal the illustrator’s usual style. Rather than the glamour of tourists wining and dining in sophisticated style, Maria Keil (Silves, 1914 – Lisboa, 2012) preferred the pagan sensuality of the joys of wine and the omnipresent sun of the Algarve. The commission from Estúdio ETP, a pioneer publicity agency with which Keil worked regularly, was for a Wine List for the Hotel Algarve in Praia da Rocha, which showed that the tourism industry still had a fondness for editorial illustration in the 1960s. Keil’s artistic and metaphoric freedom is a rarity in the wine industry merchandising as illustrations were then generally rural landscapes and the heroic task of harvesting grapes. Its importance for the Estado Novo regime can be inferred by a slogan attributed to Salazar in 1935: ‘To drink wine is to give food to a million Portuguese. The wine list came in a heavy cream cardboard ring binder with six direct colour prints on it and decorated with eleven deities reclining in various positions according to a fanciful geography of demarcated vineyards in simple maps also drawn by Keil and which the waiter at the Hotel Algarve would recommend to their esteemed clients.

As ilustrações foram restauradas digitalmente  The illustrations were digitally restored

A Carta de Vinhos foi amavelmente cedida por Carlos Rocha

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Folhas Caídas (V)

As ilustrações foram restauradas digitalmente  The illustrations were digitally restored

Fontes Sources

Maria Keil: Um grafismo de Afectos, Rui Afonso Santos in http://purl.pt/708/1/maria-keil.html

Inconfundível Maria Keil, Fernando de Azevedo, in Histórias para gente e palmo e meio, catálogo, CML, 2001

A praça é uma sala com árvores, João Paulo Cotrim, in Maria Keil, catálogo, Câmara Municipal do Barreiro/VerPraLer, 2007

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Folhas Caídas (IV)

As ilustrações foram restauradas digitalmente  The illustrations were digitally restored

Fontes Sources

Inconfundível Maria Keil, Fernando de Azevedo, in Histórias para gente e palmo e meio, catálogo, CML, 2001

A praça é uma sala com árvores, João Paulo Cotrim, in Maria Keil, catálogo, Câmara Municipal do Barreiro/VerPraLer, 2007

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Folhas Caídas (III)

A Senhora da Conceição, Contos Tradicionais Portugueses, 1958

São 572 páginas de histórias de raíz popular para uma obra da época de ouro dos livros em fascículos colecionáveis, os anos cinquenta do século passado. Quando comparado com outras compilações do género como As Lendas de Portugal, que foi um verdadeiro quem é quem da ilustração editorial portuguesa, estes Contos Tradicionais Portugueses, publicados pelas Iniciativas Editoriais em 1958 têm apenas um autor para as suas 167 ilustrações. Maria Keil aplica aqui o seu apurado instinto de grafista, em composições simples de elementos soltos, que nada devendo à perspetiva, não desdenham da profundidade tridimensional, e se desdobram em  diferentes planos. A violência das forças da natureza e das paixões humanas neste mundo rural, medievo e supersticioso, está presente no traço duro e negro de Keil, quase esboçado, marcando rugas e dores, construindo sombras em feixes, expondo a fragilidade da carne perante desígnios fatalistas que ultrapassam a condição humana ou o triunfo de uma sabedoria milenar sobre as manhas do diabo. Sinal da apurada confeção gráfica deste género de obras, Keil dispõe de uma suplementar e patriótica bicromia que é muito mais que capricho decorativo dos fifties. O verde marinho e o vermelho coral modelam volumes, diferenciam tempos e espaços na narrativa ou são ainda sujeito da história como a chuva de raios que se abate sobre a multidão da história A Senhora da Conceição.

Fallen leaves III

These are 572 pages filled with stories rooted in folktales and belong to that golden era of books that came out in instalments in the 1950s. Unlike other compilations of its kind, such as As Lendas de Portugal [Legends of Portugal], which became a ‘Who’s Who’ of Portuguese editorial illustrators, just one person did all 167 illustrations for these Contos Tradicionais Portugueses [Traditional Portuguese Tales] that Iniciativas Editoriais published in 1958. Maria Keil here used her sophisticated graphic sense in simple compositions with loosely-drawn figures that owe nothing to perspective but still have three-dimensional depth and unfold on different planes. The violence of the forces of nature and human passions in this medieval and superstitious rural universe is felt in Keil’s hard black line, almost merely sketched in to mark wrinkles and pain while projecting shadows into beams of light, revealing both the fragility of the flesh when confronted by fateful determinations that overcome our human condition and the triumph of ancient wisdom over the devil’s wiles. As a sign of the graphic stylishness of this kind of work, Keil used an additional patriotically Portuguese two-colour scheme that is very much more than a decorative caprice of the 1950s. Sea green and coral red shape the volumes, differentiate times and places in the story and are also part of the story, such as in the one about thunderbolts raining down on the multitude in A Senhora da Conceição.

O grilo e o leão, Contos Tradicionais Portugueses, 1958

O cego e o moço, Contos Tradicionais Portugueses, 1958

O diabo e a sogra, Contos Tradicionais Portugueses, 1958

Os dez anõezinhos da tia verde-água, Contos Tradicionais Portugueses, 1958

As ilustrações foram restauradas digitalmente  The illustrations were digitally restored

Fontes Sources

Inconfundível Maria Keil, Fernando de Azevedo, in Histórias para gente e palmo e meio, catálogo, CML, 2001

A praça é uma sala com árvores, João Paulo Cotrim, in Maria Keil, catálogo, Câmara Municipal do Barreiro/VerPraLer, 2007

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Folhas Caídas (II)

Place-Names, Algarve, SNI, 1947

Communications, Algarve, SNI, 1947

Excursion I, Algarve, SNI, 1947

Silves, Algarve, SNI, 1947

Lugares românticos de Lisboa, Lisboa, SPN, 1941

Tipos de Lisboa, SPN, 1941

Lugares românticos de Lisboa, Lisboa, SPN, 1941

Tipos de Lisboa, Lisboa, SPN, 1941

Tipos de Lisboa, Lisboa, SPN, 1941

As ilustrações foram restauradas digitalmente  The illustrations were digitally restored

Fontes Sources

Inconfundível Maria Keil, Fernando de Azevedo, in Histórias para gente e palmo e meio, catálogo, CML, 2001

A praça é uma sala com árvores, João Paulo Cotrim, in Maria Keil, catálogo, Câmara Municipal do Barreiro/VerPraLer, 2007

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Folhas Caídas (I)

Barca Bela, Folhas Caídas, 1955

Por aqui passam dois livros de poesia, Folhas Caídas de Almeida Garrett e Luar de Janeiro de Augusto Gil, publicados pela editora Portugália nos anos cinquenta. Ilustrados por Maria Keil (Silves, 1914-Lisboa, 2012). Nas seis ilustrações a preto de Folhas e nas dezanove a sanguínea de Luar, a caligrafia de Keil é personalizada por uma vertigem cinética que lembra o traço nervoso de Júlio Gil. Mas o que era êxtase e sofrimento em Gil, é matéria em Keil. Matéria de sonhos mas ainda assim sujeita às leis e forças da Natureza. Onde se incluem as alegrias e tristezas dos amantes que povoam a paixão clandestina de Garrett pela Viscondessa da Luz ou a misoginia dolente de Augusto Gil. Keil domestica as paixões humanas sem malícia, a traço rápido, quase impreciso, riscando rostos vazios, sombras e transparências que evocam ainda o surrealismo da década anterior e que viria a refinar na obra-prima da literatura para crianças de 1967, O Cantar da Tila.

Fallen leaves I

Here we have two books of poetry, Folhas Caídas [Fallen Leaves] by Almeida Garrett and Luar de Janeiro [January Moon] by Augusto Gil, that were published by Portugália Publishers in the 1950s.  They were both illustrated by Maria Keil (Silves, 1914 – Lisbon, 2012).  In the six black and white illustrations she did for Folhas and the nineteen blood red ones for Luar, Keil’s calligraphy grows personalized in a form of kinetic dizziness reminiscent of Júlio Gil’s edgy drawings. However, Maria finds material in what, for Gil, was ecstasy and suffering.  Material for dreams but even so, subject to the laws and forces of nature. The joys and woes of the lovers that experience the secret passion the writer Almeida Garrett felt for the Viscountess da Luz or the pained misogyny of Augusto Gil.  Keil, with no malice, tames human passions; her swift, almost imprecise drawing line etches empty faces, shadows and transparencies that also evoke Surrealism in the 1940s and which she was to perfect in that masterpiece of children’s literature in 1967, O Cantar da Tila [The Song of Tila].

As ilustrações foram restauradas digitalmente  The illustrations were digitally restored

Rosa sem espinhos, Folhas Caídas, 1955

Não te amo, Folhas Caídas, 1955

Este inferno de amar, Folhas Caídas, 1955

Joaninha, Luar de Janeiro

Meditações sobre temas do Eclesiastes, Luar de Janeiro

O nosso lar, Luar de Janeiro

As ilustrações foram restauradas digitalmente  The illustrations were digitally restored

Fontes Sources

Inconfundível Maria Keil, Fernando de Azevedo, in Histórias para gente e palmo e meio, catálogo, CML, 2001

A praça é uma sala com árvores, João Paulo Cotrim, in Maria Keil, catálogo, Câmara Municipal do Barreiro/VerPraLer, 2007

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