almanaque silva

Ícone

histórias da ilustração portuguesa

Luz negra

Pela primeira metade dos anos quarenta do último século, alguma da excelente ilustração editorial portuguesa impressa em livros e revistas carregava-se de densos negrumes e clarões de luz, longe dos cânones da “linha clara” modernista. Em O Vale dos Encantos, novela infantil de 1942 escrita por Maria Lamas, contam-se as peripécias quotidianas de Maria da Luz, uma conscenciosa menina de oito anos, que refletia a produção habitual da autora, histórias de cariz realista passadas em ambiente rural. As aventuras de Maria da Luz são iluminadas por um formidável claro-escuro que Roberto Araújo (Lisboa, 1902-1969) pratica nas onze ilustrações que acompanham o texto e as divertidas aventuras da pequena, em desenhos primorosos cujo teor narrativo e composição se associam facilmente à ilustração e banda desenhada publicadas nas prolíficas revistas juvenis da época. Experimentado cenógrafo e gravador, Araújo aplicava na tinta o efeito seguro da gravura, em traço estilizado, longe da organicidade de Manoel Lapa nos livros da Colecção B de António Ferro, ou da aspereza gráfica de José de Lemos em trabalhos para a revista Atlântico, feitos com os mesmos contrastes de luz e sombra. Longe da mera inversão de positivo-negativo, os brancos de Araújo modelam volumes e ampliam os movimentos das personagens d’O Vale dos Encantos. Ainda na Atlântico, no primeiro número, Araújo ilustraria no mesmo ano um conto em registo semelhante ao do livro de Maria Lamas. Mas as suas mais memoráveis colaborações ilustradas foram as capas da coleção policial Escaravelho de Ouro, da editora Édipo, datadas de 1954, e onde Araújo oscila entre engenhosos dominós cromáticos e a vulgata surrealista para a ilustração policial.

Black light

In the first half of the 1940s, some of the excellent Portuguese editorial illustrations printed in books and magazines were filled with thick black patches and flashes of light, a far cry from modernism’s “clear line” style. O Vale dos Encantos  [Valley of Enchantments], a 1942 children’s book by Maria Lamas, tells of the daily adventures of Maria da Luz. A conscientious eight-year-old, she reflects the author’s usual writing of realistic fiction stories that take place in the countryside. Her adventures are lit up by the wonderful chiaroscuro that Roberto Araújo (Lisbon, 1902-1969) used in his eleven illustrations depicting the young girl’s amusing escapades. These exquisite drawings are of a narrative style and composition and easily comparable to illustrations and strip cartoons in numerous young people’s magazines of the time. An experienced scenographer and engraver, Araújo applied on ink the safe effects of engraving in a stylised manner. Far from simple positive-negative inversion, his whites form volume and add movement to the characters of O Vale dos Encantos. That same year in the first edition of Atlântica, he illustrated a similar story to the one Maria Lamas wrote. But his most memorably illustrations are on the covers of the crime fiction ‘Escaravelho de Ouro’ collection published by Édipo in 1954. Araújo here moved between skilful use of colour schemes and the Surrealist vernacular for crime fiction illustration. 

As ilustrações foram restauradas digitalmente The illustrations were digitally restored
Fontes Sources
Dicionário dos Autores de Banda desenhada e Cartoon em Portugal, Leonardo de Sá e António Dias de Deus,  Edições época de Ouro, 1999
Maria Lamas, Catálogo, Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro, 1993

Filed under: Roberto Araújo,

Visitas

  • 621.917

Posts