Marnotos, gandarezas, vareiros, peixeiras, pescadores, banheiros, cavadores e mercadores da serra, foram fixados a guache sobre papel por um artista que tem passado a sua longa vida de 91 anos a pintar, ilustrar e caricaturar fainas e folguedos tradicionais de uma larga faixa costeira que vai da Ria de Aveiro à Figueira da Foz. Zé Penicheiro (Candosa, Tábua-1921), pintor e grafista autodidata, pinta, em três séries de bilhetes postais ilustrados, separadas por duas décadas, um amor incondicional pelo povinho industrioso do litoral. Homens e mulheres, eles sombrios, mais risonhas elas, surpreendidos nos seus árduos labores, deslocando-se à pata, de burro ou de bicicleta, revelam-se num retrato psicológico que sempre andou longe da representação ilustrada de trajes e costumes populares. O tema, desenhado por alguns dos mais virtuosos (e académicos) pintores, ilustradores e banda-desenhistas portugueses, refletiu sempre preocupações etnográficas e antropológicas, descrevendo com rigor trajes, adereços e tipos rácicos. O registo gráfico de Zé Penicheiro acompanha no papel a sua célebre Caricatura em Volume, legado da infância artística ao lado do pai, carpinteiro, que recortava as figuras populares que Penicheiro desenhava previamente na madeira. Por aqui passa também uma época em que alguns talentosos artistas gráficos se dedicaram aos tipos populares a três dimensões, como Thomaz de Melo, Júlio e Piló. Mas Penicheiro não se preocupa com as sínteses geometrizadas do Modernismo. As suas figuras de madeira são retratos humanistas e humanizados tal como os guaches destes postais, que modelam volumes em jeito de caricatura, mais sintéticos nos anos cinquenta, mais caprichosos nos setenta. Esta representação emocional pode relacionar-se com os trabalhos de cartunista a que Penicheiro dedicou anos da sua vida em jornais nacionais como O Primeiro de Janeiro, A Bola, Os Ridículos e A Bomba, e regionais como O Figueirense. Precisamos de recuar meio século para encontrar algo semelhante, na série Tipos de Lisboa, ilustrada e editada em 1904 pelo espanhol Angelo N. Pons. As figurinhas de Zé Penicheiro, por entre alegrias e tristezas, oferecem-nos o sal do seu suor e das suas lágrimas.
Tears of salt
Zé Penicheiro (Candosa, Tábua – 1921) has captured with gouache on paper the lives of people who live along the long coastline between the Ria de Aveiro and Figueira da Foz. The 91-year old artist has spent much of his life painting, illustrating and drawing caricatures of saltpan workers, fishwives, fishermen, lifeguards, farmhands and market vendors in this area. A self-taught painter and graphic artist, he has always loved the ocean. He has also demonstrated his unreserved love for these industrious workers too in three sets of illustrated postcards he did over a 20-year interval. He catches them as they go about their business on foot, donkey back or bicycle: most men looking rather solemn unlike their womenfolk who smile broadly. Theirs is a psychological portrait far removed from the usual depictions of ordinary working people in traditional costumes. Some of the most talented (and academic) Portuguese painters, illustrators and strip cartoonists have approached the same subject matter but always with ethnographic and anthropological concerns to get absolutely right the racial types, costumes and trappings. Zé Penicheiro continues on paper the graphic style of his famous Caricatura em Volume, which owes so much to his artistic upbringing as the child of a carpenter, who would cut out drawings of typical Portuguese working men and women that his son made on wood. This was a time when other gifted artists, such as Thomaz de Melo, Júlio and Piló, were also designing these three-dimensional representations. But Penicheiro wasn’t bothered with the geometrical synthesis of Modernism. His wooden figures are humanistic and humanised portraits as are his postcard gouaches. He shapes volumes as if caricatures, more synthesised in the 1950s and more whimsical in the 1970s. The feeling they give could be related with the work he did for such a long time as a cartoonist for Portuguese national newspapers such as O Primeiro de Janeiro, A Bola, Os Ridículos, A Bomba, and the regional O Figueirense. We must go back fifty years to find something similar in a set of typical Lisbon characters that the Spaniard Angelo N. Pons illustrated and published in 1904. Zé Penicheiro’s little figures, between their joys and woes, offer us the salt of their sweat and tears.
Série Costumes Regionais, edição da Comissão Municipal de Turismo da Figueira da Foz, [1954]: Peixeira e Marnoto / Peixeira de Buarcos e Cavador / Pescador de Buarcos e Banheiro / Salineira e Pescador de volta da pesca / Mulher de Tavarede e Padeira das Alhadas / Gandareza de Quiaios e Pescador consertando a rede
Série Costumes Regionais, edição do Museu Municipal da Figueira da Foz, s.d.: Mulher do sal e Peixeira de Buarcos / banheiro e Cavador de Tavarede / Mulher da serra e Pescador de Buarcos / Padeira das Alhadas e Vendedeira / Marnoto e Consertando a rede / Mulher das pevides e Gandaresa de Quiaios
Série [Costumes], edição da Comissão Municipal de Turismo – Aveiro, 1974: Tricana de Aveiro (séc. XIX) e Salineira / Peixeira e Mulher dos ovos moles / Mulher da beira-ria e Mulher das Gafanhas / Moliceiro e Marnoto / Homem do gabão e Mordomo / Pescador de S. Jacinto e Pescador bacalhoeiro
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Fontes Sources
http://anexosjopf.blogspot.pt/2012/04/ze-penicheiro.html
http://blog-do-manel.blogspot.com/2010/04/ze-penicheiro.html
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