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histórias da ilustração portuguesa

Ceci n’est pas un livre

Pelos anos trinta do século passado, os ilustradores portugueses aplicavam elegâncias decorativas à matriz rural do país, uma regressão associada aos valores do Estado Novo e enquadrada pela Política do Espírito do SPN (Secretariado de Propaganda Nacional, criado em 1933) e do seu mentor, António Ferro. Em Paris havia Adolphe Mouron, aliás Cassandre, nascido ucraniano, célebre pelos seus portentosos cartazes publicitários de velozes comboios e glamourosos transatlânticos em registo Art Deco apurado desde meados de vinte. Cassandre criou os primeiros cartazes publicitários feitos para serem vistos a partir de veículos em movimento, a campanha Dubo Dubon Dubonnet, para os vinhos Dubonnet, em 1932. Se os meios de transporte e as vias de comunicação portuguesas não ofereciam particular atração, sobrava a ficção doméstica, suficiente para aplicar a receita. Em capas de livros da Editora Civilização, por volta de 1933, temos a mesma vertigem pela velocidade, os planos oblíquos, as formas geometrizadas, a tipografia integrada com maiúsculas de recorte modernista, os mesmos planos e volumes em sombreados obtidos a stencil e aerógrafo. Nas novelas campestres e poemas de Campos Monteiro ou nas memórias coloniais de Campos Monteiro Filho e Hipólito Raposo, destacado dirigente do Integralismo Lusitano, temos o grafismo mais cassandriano alguma vez feito em Portugal, comparável a algumas das publicidades do grafista suíço Fred Kradolfer, radicado em Lisboa desde 1924. A assinatura ARS, bem visível nas capas da Civilização é a do atelier que Adalberto Sampaio (Porto, 1910-1998), autor confesso de algumas destas capas e suspeito das restantes, criou com três companheiros de tertúlia, ainda estudantes de arquitetura, Cunha Leão, Morais Soares e Fortunato Cabral. Todos eles pertenciam ao grupo artístico portuense Mais Além, que consta também como assinatura de algumas fantásticas capas do magazine Civilização, também da autoria presumida de Sampaio. A partir de 1938 foi comentador gráfico desportivo no diário portuense Primeiro de Janeiro, retratando ao longo de meio século as peripécias da bola.

Ceci n’est pas un livre

In the 1930s, Portuguese illustrators were stylishly ornamenting Portugal’s  rural matrix – a regressive move due to the New State’s set of values as framed by the Politica do Espírito of SPN – the regime’s propaganda office, which its mentor, António Ferro, set up in 1933. In Paris there was the Frenchman born in Ukraine, Adolphe Mouron aka Cassandre, famous for his extraordinary Art Deco publicity posters of fast trains and glamorous transatlantic liners.  Cassandre created the first publicity posters designed to be seen from moving vehicles, the ‘Dubo Dubon Dubonnet’ posters for the Dubonnet wine company in 1932. If Portugal’s transport and communication systems weren’t really that noteworthy, there were more than enough home-grown fictional ingredients for the same recipe to be used. Around 1933, the Editora Civilização book covers showed the same dizzying effects of speed: tilted planes, geometric shapes, integrated typography with capital letters in Modernist cutouts and the same planes and volumes shaded in with stencil aerograph spray. The graphics in Campos Monteiro’s novels and poems with their rural themes and in the colonial memoirs of Campos Monteiro Filho and Hipólito Raposa, an outstanding leader of Integralismo Lusitano (a movement that advocated Portuguese traditionalism but not conservatism) are the most similar to Cassandre’s work that were ever done in Portugal and comparable to some advertisements designed by Fred Kradolfer, a Swiss artist living in Lisbon since 1924. The plainly visible letters ARS on the Civilização covers represent the signature of the studio that Adalberto Sampaio (Porto, 1910-1998), the acknowledged creator of some of these covers and suspected creator of the rest, set up with three fellow habitués of literary and artistic circles that met in cafés. Cunha Leão, Morais Soares and Fortunato Cabral were still architecture students and members of Porto’s artistic group Mais Além, which also appears as the signature of some fantastic Civilização magazine covers, which Sampaio is also assumed to have created. Starting in 1938, he did the graphics for the sports commentary at Primeiro de Janeiro, a Porto daily, and was to illustrate the vicissitudes of soccer for fifty years.


Fontes Sources

Dicionário dos Autores Portugueses de Banda Desenhada e Cartoon em Portugal, Leonardo de Sá e António Dias de Deus, Edições Época de Ouro, 1999

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