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histórias da ilustração portuguesa

Heróis de calções

Viriato: Com denodado ardor / as gentes lusitanas / enfrentam as romanas / vencendo o invasor.

Para o Estado Novo de Salazar, o corpo e a alma deviam ser treinados para o serviço de Deus, da Pátria e dos Chefes. Não esqueçamos a letra S gravada nos cintos da farda da Mocidade Portuguesa. Significava escrupulosamente Servir (e, maliciosamente, o nome do ditador). A Educação Física apurava a Raça e a exaltação dos feitos históricos contribuía para a formação patriótica dos infantes. Juntando História e Ginástica, o capitão Alberto Feliciano Marques Pereira, redigiu o livro O Valor Moral da Educação Física, quinto e último de uma série sobre ginástica infantil editada entre 1946 e 1951. Nos dois primeiros capítulos, o autor afeiçoava a formação física aos valores da moral cristã e do amor à Pátria. No terceiro capítulo, passava ao ginásio. O caráter belicista do programa inspirava-se em algumas das mais cruentas carnificinas da gesta portuguesa, escolhidas para ilustrar os exercícios, e complementava a integração das crianças em organizações militaristas como a Mocidade Portuguesa.

As quadras rimadas e as imagens aguçavam o interesse dos professores e da petizada. As ilustrações foram feitas a quatro mãos. As de Álvaro Duarte de Almeida (Moçâmedes, 1909-1972) prolífico ilustrador de literatura infantil e de uma interessante História da Tauromaquia; e as de Eduardo Teixeira Coelho (Angra do Heroísmo, 1919-Florença, 2005), monstro sagrado da história dos quadradinhos portugueses. O traço uniforme e limpo de Duarte de Almeida confere às cenas históricas uma extrema legibilidade, a regularidade do traço a rebater perspetivas, tornando as cenas imponentes como se pode confirmar no exercício das Invasões Francesas. Teixeira Coelho, apesar da sua competência em temas históricos (criou verdadeiras clássicos do género como O Caminho do Oriente, de 1946), ficou relegado nesta parceria para as mais modestas cenas de ginásio, raramente assumindo o seu famoso traço e as composições cinéticas da revista infantil Mosquito. Se a linearidade de Álvaro Duarte de Almeida resistiu melhor ao tempo, o interesse destas imagens radica sobretudo no retrato de uma ideologia  que nos parece agora um anacronismo de anedota.

O semeador: Bendigo a deus, a Deus louvo o valor / do nosso povo: marinheiro denodado, / alma de herói e soldado, / da terra cultivador, / camponês e lavrador…

A Batalha de Aljubarrota: Pela Pátria vencereis, / inda que um contra seis…

O Decepado: Ninguém soube guardar / melhor uma bandeira… / À mão que era estrangeira / jurou não a entregar… / Na História foi chamado / o Grande Decepado.

Partida de Vasco da Gama para a Índia: Eis a largada e já começa a ver-se / o mais belo Padrão da História a erguer-se / Eregem-no, a partir desse momento, / as velas desfraldadas pelo vento. / Ufana a Pátria as vê. Vasco da Gama / não procura a riqueza, nem a fama… / o pensamento leva outro ideal / quando no peito, bate Portugal.

Os Portugueses nos mares da China: Macau foi dado / aos portugueses / de bom grado / pelos chineses. / Foi paga imensa, / foi paga grata / da luta intensa / contra o pirata.

Luís de Camões: Em letras de oiro ‘sculpiu / o nome da terra amada. / Ninguém melhor esgrimiu / com a palavra e a espada.

Invasões Francesas: Desde o primeiro instante ao derradeiro / a Pária será por ti, meu coração!… / Lutar, morrer, mas nunca a sujeição / ao invasor, ao vil, ao mau estrangeiro!

1ª. Guerra Mundial: Heróicos actos encerra / Nove de Abril / Grande Guerra.

As ilustrações foram restauradas digitalmente

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