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histórias da ilustração portuguesa

Em menos de um fósforo

A indústria fosforeira portuguesa foi um monopólio desde 1895, ainda em plena Monarquia. A simplicidade do artefacto casava bem com os brandos costumes portugueses e o Estado Novo entravou por muito tempo a vulgarização dos acendedores e isqueiros com taxas e coimas que só se extinguiram em 1970. As coleções de caixas e carteiras de fósforos tornaram-se nos anos 50 um acréscimo simpático de cultura geral para fumadores, donas de casa à volta do fogão e colecionadores de palmo e meio. Tudo cabia nestas mini-enciclopédias: armas e uniformes militares, bicharada vária, paisagens e monumentos, transportes, craques do futebol. Como aconteceu nas emissões filatélicas, as empresas fosforeiras não tiraram particular partido da mestria gráfica e decorativa das várias gerações modernistas portuguesas.
Com uma curiosa exceção: TOM, ou seja, Thomaz de Mello (1906, Rio de Janeiro-Lisboa, 1990), figura maior da segunda geração modernista e das artes gráficas portuguesas. Na série de 30 carteiras Cachimbos, e nas duas de 10 carteiras Costumes, TOM expressa um genuíno sentimentalismo pelas classes populares que já tinha provado amplamente ao serviço do SNI (Secretariado Nacional de Informação) de António Ferro, e em 1957 com o livro Nazaré. O traço sintético de pincelada grossa e as cores planas adequam-se bem à miniatura. Se a receita parece óbvia, a história gráfica destes suportes mostra-nos que foi mais exceção que regra. TOM desenharia ainda outra série, de seis etiquetas para caixas de fósforos, com o tema Flores e as mesmas qualidades de síntese gráfica. Todas elas produzidas pela Sociedade Nacional de Fósforos, entre 1957 e 1960.

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2 Responses

  1. Roger Teles diz:

    Brilhante e elementar, caro Silva.
    Estou fã.

    Abraço

    Roger

  2. Vi há tempos, no alfarrabista Campos Trindade na Rua do Alecrim, um exemplar de um livro ilustrado pelo Thomaz de Mello sobre poemas de Camões, creio, ou algo comemorativo de Camões, publicado se bem me lembro em 1972. Uma coisa soberba não só na qualidade do desenho (algo “mantiano”, é verdade, com alguma influência, pareceu-me, dos desenhos do JAM dessa altura, e espero não ofender a memória do TOM) como no design. Coisa cara, infelizmente, mas coisa para recordar mesmo em visita rápida.

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